Pesca do Atum - 2° parte
As coisas apenas valem pela importância que lhes damos.
Essa importância esquecida , com o apagar da luz do desenvolvimento industrial e comercial, perdidos no tempo, esquecidos na história, escondido no pensamento de alguns. Os Sicilianos, a quem eu, em nome de minha cidade, presto homenagem, pelo ensinamento de novas técnicas na pesca do atum e pelo grande contributo no desenvolvimento económico da cidade de Lagos entre os Sec. XIV e XVI
Os Siciliano e os Índios da Meia-Praia tem muito em comum, o mar, o arraial, a armação e a almadrava (um sistema de redes de grandes dimensões para a pesca do atum).A cada almadrava no mar correspondia um arraial em terra.
O arraial era um conjunto de cabanas onde os pescadores residiam com as suas famílias durante a temporada da pesca. Na obra Corografia do Reino do Algarve, escrita por Frei João de S. José em 1577, descreve um arraial de pescadores:
«A pescaria deste peixe não só é proveitosa, [...] mas também de muito gosto e desenfado, porque [...] acode a ela grande soma de pescadores de todo Algarve, com suas mulheres, filhos e outra chusma e fazem suas cabanas por toda a costa onde estão as armações e continuadamente acode a eles toda a gente comarcã a lhe trazer todo o mantimento e refresco necessário e levar peixe, assi deste como d'outro que também ali morre. De maneira que cada armação parece ua feira. Cada armação não traz menos de 70, 80 homens de serviço, com suas barcas e caravelões pera recolher e levar o peixe onde se há-de dizimar e pagar os mais direitos, afora os mercadores do reino e d'outros muitos estrangeiros que tratam nele e o levam a suas terras.»
A pesca do atum no Algarve interessou particularmente aos armadores e pescadores catalães e italianos, sobretudo Sicilianos. Em 1367 armadores Sicilianos estabelecidos em Lagos levam a cabo experiências visando uma maior eficácia das almadravas, e em 1440 D. Duarte arrendou-as a uma sociedade de Sicilianos. Depois, em 1485, catalães e italianos exportavam milhares de arrobas de atum salgado para os seus países a partir do porto de Lagos.
No princípio do Séc. XVI, Lagos caracteriza-se pelo rápido crescimento demográfico, e o mais importante porto de pesca e centro de exportação de pescado da Europa, especilamente do atum para Itália. Portimão e Faro eram caracterizados pela exportação dos frutos secos. Mas também o sal, que torna esta zona, no maior produtor e exportador da Europa. Tão avultado era o comércio que se fazia no porto de Lagos, que incitou a cobiça dos Franceses, os quais infestaram os mares com corsários, que sequestravam as caravelas com carga, a tal ponto que foi pedido ao D. Joao III que interviesse na defesa da costa e do apoio ao tráfico marítimo.
Os Sicilianos se estabeleceram em Lagos, e por aqui ficaram mais de um século, foi-lhes concedidos regalias especiais, pela importância e ensinamentos de novas técnicas, de salgar o peixe, que abriu a possibilidade de exportar em grande escala. Em 1537 os nobres Sicilianos naturais de Messina, junto a alguns genoveses e milaneses, fundam em Lagos com a autorização e direitos concedidos pelo papa a Igreja Nossa Senhora do Porto Salvo, pelo facto da comunidade ser de alguma forma relevante, e com uma identidade bem definida. Elegem um capelão para celebrar missas, aos sábados e domingos de cada semana e para administração de sacramentos. Constituírem uma cofraria com sede na igreja de S. Bráz. Em 1546, finalizam os trabalhos de edificação da igreja. Alguns anos depois começam a surgir alguns desentendimentos e cobiça do local. Até que alguns monjes decidem construir um convento no mesmo lugar, projeto que virá a ser pedido a apreciação aos membros da comfradia de Felipe em 17 de agosto de 1598. O conflito se resolve dois anos depois, com um compromisso em 27 de julho de 1600 frente ao notário Afonso Alves Camacho e a presença do governador do Algarve. Os frades, em troca de poder levantar seu convento, se comprometem a celebrar e manter os mesmos princípios, como funerais e todos os exercícios espirituais que
se celebravam antes, na igreja de Nossa Senhora de Porto Salvo, em benefício exclusivo dos italianos.
Este trabalho de pesquisa, valorizou meu conhecimento da história de Lagos no campo económico e industrial, muito se poderá escrever sobre este assunto, a cidade estava no top do mundo na indústria e exportação do peixe, do sal e frutos secos, existiram mais de 10 fábricas de conserva de sardinha, nos anos cinquenta ainda metade funcionava em pleno. Não só os descobrimentos escreveu Lagos na história do mundo, por isso a necessidade de lembrar que a história de Lagos não se resume somente à epopeia dos descobrimentos, também na economia, como pioneira na indústria dos derivados do mar e dos negócios da exportação, um passado tão rico que não nos podemos dar ao luxo de esquecer, e ao mesmo tempo, lembrar os lacobrigenses e todos aqueles que de longe vieram para contribuir para o desenvolvimento desta cidade.
A pergunta que gostaria de fazer a alguém, seria, o porquê de tanta confusão e falta de informação no monumento, considerado património de interesse histórico, construído pelos Sicilianos? A Igreja Nossa Senhora do Porto Salvo, que no portal da Câmara Municipal de Lagos é conhecido simplesmente, por, Ruínas do antigo Convento da Trindade, e nenhuma referência à história das verdadeiras raízes do monumento. Já o Ministério da Cultura, vai mais longe, aqui o monumento, é conhecido por, Antigo Convento dos Frades Trinos, com uma pequena referência à confraria de Porto Salvo.
Seria conveniente uma maior atenção, aquelas pequenas coisas que deixaram de ter interesse por vontade do tempo, razão pela qual, hoje estão num profundo abandono, físico e literário.
P.S.: Este monumento é muito valioso, não só pela sua história, mas pela localização onde está implantado. Seu terreno arável é muito cobiçado, paredes meias com urbanização da Iberlagos, e com a casa que a Angelina Jolie quer comprar. Não podemos deixar que os privados, o dinheiro, seja mais forte que a vontade dos lacobrigenses, uma consulta pública exige-se.
Senhor Dr. Júlio Barroso, sei que é um adepto da Blogesfera, sei também que o senhor como lacobrigense e amigo, gostaria que aqui no Convento da Trindade fosse feito algo para a cidade e para os lacobrigenses, parar toda esta degradação e abandono do monumento, também sei que a pressão gananciosa de alguns sobre o senhor é constante. Juntos vamos conseguir acabar com este desprezo, e dar razão à nossa história. Um “Museu da Pesca do Atum”, lembrar os Sicilianos, e tudo relacionado, como a indústria do sal, a estiba,etc. No seu terreno com aquela vista espetacular virado para o mar, um jardim do silêncio, onde depois da visita ao museu, possamos sentar, reflexionar , contemplar, e pelo meio, uma merenda com os olhos no mar, ler um livro, sei lá. Esse silêncio aí encontrado, foi a razão pela qual os Frades Trinos construiram aí seu convento, contra a vontade dos sicilianos.
De certeza que o turismo italiano nos irá procurar com mais interesse, porque turismo, não pode ser só praia, é também cultura, esse turismo cultural, que vai faltando em Lagos.
Quanto vale esta mancha verde?
Referências:
70 IANTT, Livro Sexto de Misticos, fols. 164v.-166v. (Vease la transcripcion y traduccion en V. D’ARIENZO-B. DI
SALVIA: Siciliani nell’Algarve..., p. 170-175).
71 ASN, Camera della Sommaria-Partium, 123, fols. 36v-37 (Vease la transcripcion. V. D’ARIENZO-B. DI SALVIA:
Siciliani nell’Algarve..., pp. 185-186).
Para consultar este monumento no ministério da cultura:
http://radix.cultalg.pt/visualizar.html?id=13046Para consultar este monumento na Câmara Municipal de Lagos:
http://www.cm-lagos.pt/portal_autarquico/lagos/v_pt-PT/menu_turista/concelho/cultura/museus/ruinas+historicas/